Culturas
Muhammad Ali: Rimas como punhos

Boxeador e poeta em voz alta. Olharmos para a poética de Muhammed Ali como umha forma de entender algumhas das similitudes e das eficácias da nossa poesia oral. As rimas e os punhos, a oralidade e o corpo como ferramentas das oprimidas para a resistência e a imaginaçom política.

Mohammad Alí
Mohammad Ali (1966). Fonte: Dutch National Archives, The Hague, (ANEFO), 1945-1989. Creative Commons.
15 dic 2019 12:00

Disque Muhammad Ali quando criança inscreveu-se no ginásio Columbia, na sua cidade natal de Louisville, e começou a boxear como reaçom ao roubo na rua da sua bicicleta infantil. Como reaçom, também, protagonizou anos depois outros acontecimentos que no deportivo e no político, e na conjunçom das duas, fôrom lembrados em filmes e biografias, caricaturizando as mais das vezes a sua alta capacidade para a controvérsia verbal e umha dramatizaçom nas declaraçons a imprensa que superavam qualquer expetativa de entrevista desportiva. É sabido que a prática do boxe e a particular dança dentro do ringue eram qualidades amplamente controladas por Muhammad Ali, mas o que também sabia fazer bem o duas vezes campeom dos pesos pesados era recitar versos.

Racismo
Hai superheroes que non levan capa
Nos 50 as persoas negras debían viaxar na parte traseira dos trenes e autobuses, e só podían beber nas fontes públicas coa frase “colored”.
“I’m not only fighter, i’m a poet” (“Nom sou apenas um luitador, sou um poeta”), dizia o púgil, algo subido de tom e testosterona, ao jornalista que o entrevistava durante um dos seus treinos.

Muhammad Ali aprendeu a improvisar com o seu barbeiro. Com ele ia criando versos e coplas, improvisavam ao modo da regueifa e foi nesse ambiente que reparou em que através da rima poderia ajudar-se na preparaçom do combate, reptando os seus adversários dumha forma bem mais vistosa. Ali utilizou esta prática também em numerosas conferências e apariçons em night-shows televisivos. Numha entrevista antes do combate contra o temido Sonny Liston, Ali respondeu rapidamente à pergunta sobre como decorreria o encontro com umha copla: “Here I predict Mr. Liston's dismemberment. I'll hit him so hard; he'll wonder where October and November went” (“Prevejo aqui o desmembramento do Sr. Liston. Eu vou bater nele com muita força; ele vai-se perguntar para onde é que fôrom outubro e novembro”). A sua aposta na poesia oral também como performance de entretenimento dum público amplo era evidente. A sua velocidade lançando punhos e construindo versos contra o adversário, também.

Ali utilizou a improvisaçom oral em numerosas conferências e apariçons em night-shows televisivos

Nom é novidoso o uso da controvérsia oral como ato de substituiçom da violência física. Joám Evans Pim analisou em diferentes textos a utilizaçom da improvisaçom oral em diversas culturas, como a inuíte ou a galega, como ferramenta para resolver tensons e conflitos latentes entre membros das mesmas comunidades. É certo que muitas das vezes estes encontros tornavam, ainda contudo, numha violência física por vezes letal que ficou plasmada em surpreendentes e lamentáveis manchetes nalguns jornais galegos de começos do século XX. O próprio Evans Pim falou da possível decadência da regueifa no século passado devido à multiplicaçom de casos de brigas durante as controvérsias orais que, desrespeitando as regras do repente tradicional, chegavam nalguns casos a causar a morte de algumha das pessoas implicadas.

Parece que a imprensa norte-americana, no caso dos poemas orais recitados por Muhammad Ali, pouco habituada a tanta figura literária e pouco interessada em dar espaço a algumhas das reivindicaçons políticas elaboradas nas suas poesias, caricaturou o boxeador com tom apenas humorísico, desativando alguns dos conteúdos e reivindicaçons políticas mais evidentes e radicais, e enfatizando umha imagem edonista às suas intervençons.
A visom mudou quando na década de setenta, e envolvidos num quadro de reivindicaçons e luitas da comunidade negra em que o Ali se posicionou, passeava polas ruas com o seu colega Malcom X, muito interessado no contributo do púgil ao movimento do “black power”, devido ao impacto que para o momento já causava em toda a comunidade negra (e nom só). Assim, antes de acontecer qualquer conflito entre eles dous, o boxeador fazia-se chamar publicamente de Cassius X, o “nome em processo” da mudança pessoal e política de Cassius Clai, que pouco tempo depois mudaria para Muhammad Ali. Os dous concordavam, assim como outras pessoas do movimento, em apoiarem isso de que “é necessário pagar qualquer preço para conquistarmos os nossos direitos”. O simpático negro do boxe que rimava já nom era brincadeira.

A imprensa norte-americana caricaturou o boxeador com tom apenas humorísico, desativando alguns dos conteúdos e reivindicaçons políticas mais evidentes e radicais

Houvo depois poemas que som verdadeiros tributos à resistência do movimento negro mais rebelde. É o caso do Freedom better now, que recitou numha entrevista televisada em 1972, em Dublim. Nesta composiçom imaginava-se como prisioneiro no cárcere de Attica, onde um ano antes a polícia assassinava, por ordem de Nelson Rockefeller, trinta e três presos negros amotinados em protesto polas péssimas condiçons para umha vida digna dentro do presídio. Logo do poema, Ali aproveitou para reivindicar e solidarizar-se com a resistência irlandesa.

James W. Scott falou da oralidade como ferramenta dos débeis, dos grupos oprimidos. A sua tese focava-se nalgum ponto na ideia de que a escolha da oralidade frente à escrita seria mais umha “volta atrás” consciente do que um “atraso evolutivo”. A falta relativa de planificaçom e a imaginaçom política inscrita na improvisaçom oral facilitou em muitas ocasions a consolidaçom popular de relatos históricos das oprimidas, em contraposiçom com os grandes relatos da história dos Estados e dos vencedores. Muhammad Ali nom escreveu nengum livro, mas a sua poesia em voz alta, como a das regueifeiras ativas hoje nos nossos movimentos, bem podiam ser repensadas e repetidas, com modificaçons e apropriaçons, livres e efémeras, como os poemas de Ali.

Informar de un error
Es necesario tener cuenta y acceder a ella para poder hacer envíos. Regístrate. Entra en tu cuenta.

Relacionadas

Catalunya
Antirracismo Las muchas voces de Catalunya: identidades diversas, segregación y más de 300 idiomas
En las últimas décadas la sociedad catalana se ha transformado con la llegada de personas migrantes, que ya suponen un 21% de la población. Aunque la exclusión y el racismo siguen ahí, en el día a día lenguas, experiencias e identidades se mezclan.
Feminismos
Teresa de Lauretis Atravesar los confines
Prólogo a la reedición del libro ‘Diferencias. Etapas de un camino a través del feminismo’ de Teresa de Lauretis (Horas y horas editorial)
África
Hakim Adi, historiador “Hay mucha desinformación sobre el comunismo y su conexión con África y la diáspora”
El historiador Hakim Adi explora las conexiones entre el panafricanismo y el comunismo en una investigación que ha desarrollado en los últimos diez años y que requirió la consulta de archivos en Rusia, EE UU, Gran Bretaña y varios países de África.
#78644
31/12/2020 18:47

Muhammad Alí está ahora con Diego Armando Maradona en el cielo .🇺🇸🇦🇷

3
0
#75509
29/11/2020 11:01

Es cierto Muhammad Ali era el José Legrá de la división de los pesos pesados. 👍

3
0
#75399
28/11/2020 0:10

Gracias por escribir de boxeo.

4
0
#44879
18/12/2019 16:58

Som como punhos!

3
0
#78721
2/1/2021 20:21

Muhammad Alí era el José Legrá de los pesos pesados y José Legrá era el Muhammad Alí de los pesos plumas .
https://www.rtve.es/alacarta/videos/conexion-vintage/conexion-vintage-jose-legra-puma-baracoa-capitulo-1/5526579/
https://www.rtve.es/alacarta/videos/conexion-vintage/conexion-vintage-jose-legra-puma-baracoa-capitulo-2/5532342/
https://www.youtube.com/watch?v=BQzfrOsBTGM
https://www.youtube.com/watch?v=e6GjwPxtLVs
https://www.youtube.com/watch?v=FPPug8vFIJU

2
0
#78754
3/1/2021 2:30

Gracias por poner combates del ex boxeador cubano nacionalizado español José Legrá cuando fue campeón del mundo y campeón de Europa de los pesos plumas. 🇪🇸🇨🇺👍😎😉

2
0
Gobierno de coalición
Lawfare Sánchez cancela su agenda y para a “reflexionar” tras los ataques de la derecha y la imputación de Gómez
El presidente del Gobierno denuncia una operación contra él y su pareja, Begoña Gómez, por parte de la derecha y la ultraderecha, así como los medios afines que ha desembocado en la denuncia de Manos Limpias.
Política
Lawfare ¿Qué decisiones puede tomar Pedro Sánchez tras amagar con dimitir?
Tras el anuncio del presidente, se abren varias posibilidades que no se resolverán hasta el lunes: ¿Una moción de confianza? ¿La convocatoria de elecciones? ¿Un cambio de marco? ¿Dimitir y dar el salto a la presidencia del Consejo Europeo?
Medios de comunicación
Opinión ¿Y qué esperabas, Pedro?
Los gobiernos de derechas llevan años alimentando con dinero público a sus medios afines que esparcen bulos y manipulan sin que el Gobierno haya hecho nada para evitarlo.
Derechos Humanos
Libertades y derechos Amnistía Internacional acusa al Estado de no investigar casos graves de violación de los derechos humanos
El informe anual de esta organización de derechos humanos denuncia “la persistente falta de rendición de cuentas por las violaciones de derechos humanos cometidas por el Estado español”.

Últimas

Palestina
Palestina La Flotilla hacia Gaza anuncia un retraso de la salida de los barcos de ayuda
La organización refiere presiones internacionales para que no se lleve a cabo una misión que pretende entregar 5.500 toneladas de alimentos y productos de primera necesidad a la población atrapada en el territorio palestino.
Tratado de la Carta de la Energía
Tratados El Parlamento Europeo aprueba la salida del Tratado de la Carta de la Energía
Con una inmensa mayoría, la eurocámara vota la salida de un tratado que era incompatible con los objetivos climáticos y que España ya anunció que abandonaría.
El Salto n.74
Revista 74 Cuando los algoritmos te explotan: no te pierdas el número de primavera de la revista de El Salto
De cómo los algoritmos y la IA gestionan el trabajo de cientos de millones de personas con ritmos y condiciones del siglo XIX, y de mucho más, hablamos en nuestro número de primavera. Ya disponible para socias y en los puntos de venta habituales.
Eventos
Evento Un Salto al periodismo del futuro: súmate a nuestro primer evento para estudiantes y jóvenes profesionales
El viernes 10 de mayo, El Salto organiza una jornada de periodismo joven para profundizar en temas clave, nuevos lenguajes y formatos, desde un enfoque eminentemente práctico.
Más noticias
Derecho a la vivienda
Derechos a la vivienda Catalunya se adelanta al Gobierno central y regula los alquileres de temporada y por habitaciones
El Banco de España recomienda en su informe anual “medidas restrictivas” para controlar los alquileres turísticos, de temporada y por habitaciones, convertidos en la vía predilecta de grandes y pequeños propietarios para eludir las legislaciones.
Sanidad pública
Sanidad Pública Vecinas de Madrid preparan otra gran manifestación en defensa de la sanidad pública
Después de que Madrid supere el millón de pacientes en lista de espera y del éxito de las dos convocatorias anteriores, el espacio vecinal de barrios y pueblos prepara una gran marcha para el próximo domingo 19 de mayo.
El Salto Twitch
El Salto TV Los caseros se comen tu sueldo
En el programa en directo de Economía Cabreada del 23 de abril analizamos el mercado del alquiler y las legislaciones de vivienda con Javier Gil del Grupo de Estudios Críticos Urbanos (GECU) y Martín Cúneo de El Salto.
Especulación urbanística
Especulación urbanística El proyecto de las torres de la Ermita del Santo va al pleno de Madrid con la oposición del barrio
Los vecinos de San Isidro acusan al Consistorio de simplemente cambiar las torres de sitio pero no modificar lo sustancial del “pelotazo” y se alían en sus protestas con el Sindicato de Inquilinos y las asociaciones de Puerta del Ángel.
Derechos reproductivos
Derechos reproductivos Feministas de ocho países piden que la UE garantice el derecho al aborto a todas las europeas
El movimiento Mi voz, mi decisión comienza la recogida de firmas que forma parte de su campaña para pedir que la Unión Europea cree un mecanismo para financiar abortos en otras países a aquellas mujeres que no tienen acceso garantizado en el suyo.

Recomendadas

Derechos reproductivos
Luciana Peker y Cristina Fallarás “El aborto se ha apartado del relato feminista porque genera consenso”
Las periodistas Cristina Fallarás y Luciana Peker forman parte del grupo motor de una campaña europea que quiere blindar el derecho al aborto mediante una iniciativa ciudadana que necesita un millón de firmas para llegar a ser debatida.
Música
Música Aprendiendo filosofía con el punk patatero de La Polla Records
Los cáusticos esputos lanzados por Evaristo en las canciones de La Polla Records contenían materia adecuada para hablar de filosofía política en el instituto. Así lo entiende el profesor Tomás García Azkonobieta, autor de ‘La filosofía es La Polla’.
Pensamiento
Kristen Ghodsee “Necesitamos soluciones que podamos llevar a cabo sin la ayuda del Estado”
Esta escritora y etnógrafa estadounidense explora experiencias utópicas del pasado y del presente en su último libro ‘Utopías cotidianas’ (Capitán Swing, 2024).